Em meio à
crise, Comitê Rio 2016 corta 30% de gastos para evitar déficit.
Wyre
Davies e Jefferson Puff BBC News e BBC Brasil no Rio de Janeiro
- 5 outubro 2015
Image copyright Getty Image caption Segundo diretor de comunicações do
Comitê Rio 2016, plano de cortes abrange diferentes setores e departamentos
O Comitê Rio 2016 revelou à BBC que decidiu cortar
seus gastos em 30% para evitar extrapolar seu orçamento, estimado em R$ 7,4
bilhões, e reduzir a chance de incorrer em deficit – que segundo uma lei
aprovada em 2009 teria que ser coberto pelo governo federal, atualmente imerso
em crise econômica.
De acordo com o diretor de comunicações do Comitê
Rio 2016, Mário Andrada, o plano de cortes, que abrange diferentes setores e
departamentos, será implementado para manter o equilíbrio do orçamento dos
Jogos Olímpicos e Paralímpicos.
O total de R$ 38,7 bilhões para organizar os Jogos
está dividido em três frentes orçamentárias: Comitê Rio 2016 (verbas privadas,
estimadas em R$ 7,4 bilhões - onde haverá cortes de 30%), Matriz de
Responsabilidades (gastos com as instalações olímpicas, orçados em R$ 6,67
bilhões) e o plano de legado (com as obras de infraestrutura prometidas ao COI,
no valor de R$ 24,6 bilhões).
Para Mário Andrada, em meio ao clima de cortes e de
crise econômica no país, a população não toleraria que o governo arcasse com
excessos do Comitê. "O tempo de esbanjar acabou. Precisamos ser criativos
nas maneiras de concretizar estes cortes", disse.
A Lei Federal 12.035/2009 autoriza "a
destinação de recursos para cobrir eventuais deficits operacionais do Comitê
Organizador dos Jogos Rio 2016" - o que deixa claro o compromisso do
governo federal com o Comitê Olímpico Internacional (COI).
Protestos e verbas federais
Segundo o diretor de comunicações do Comitê Rio
2016, um dos objetivos dos cortes é evitar uma repetição da onda de protestos
vivida pelo país antes da Copa das Confederações, em 2013, e durante a Copa do
Mundo, em 2014.
"As pessoas ficam irritadas com luxo e
excesso. Temos que apertar nossos cintos", disse Andrada à BBC.
Embora os Jogos estejam garantidos pelo acordo,
firmado em lei federal entre o governo e o COI, o diretor de comunicações disse
que no atual momento do país o uso de recursos públicos para sanar as finanças
do Comitê seria uma situação altamente indesejável.
‘Apertar os cintos’ e ingressos
Acredita-se que a decisão de reduzir gastos tenha
partido de uma reunião de crise entre os gerentes e a cúpula do Comitê Rio 2016
nos últimos dias, e que a situação é drástica a ponto de pedir que arquivos que
possam ser lidos no computador não sejam impressos.
Semanas atrás os organizadores já haviam anunciado
que a cerimônia de abertura dos Jogos teria um orçamento mais tímido - segundo
o diretor Fernando Meirelles, o equivalente a cerca de 10% dos custos da
abertura dos Jogos de Londres, em 2012.
Andrada revelou à BBC que um dos motivos por trás
dos cortes drásticos é a venda de ingressos, que até o momento está aquém do
esperado pelos organizadores.
Dos 5 milhões disponíveis, somente 2 milhões já
foram comercializados, o que fará com que o Comitê Rio 2016 abandone o sistema
de sorteios e coloque as entradas remanescentes à venda direta online, com a
opção de pagamento em prestações.
Image copyright AP Image caption Um dois objetivos dos cortes é evitar
uma repetição da onda de protestos vivida pelo país antes da Copa das
Confederações e durante a Copa do Mundo.
Voluntários e tendas
Segundo ele, a redução de gastos será percebida
pelo público, já que o evento contará com estrutura mais tímida e que nos
bastidores das competições haverá "mais tendas e menos paredes".
Entre as novas diretrizes orçamentárias estão
ordens dadas aos gerentes e diretores responsáveis pela infraestrutura dos Jogos,
entre elas justificativas para contratar novos funcionários e redução do
escopo.
Os cortes também afetarão o número de voluntários,
que deve ser reduzido de 70 mil para 60 mil. Meses atrás o programa de
voluntários já havia sido alvo de polêmica, quando o Comitê Rio 2016 foi
questionado se conseguiria selecionar e treinar (incluindo com aulas de inglês)
os 70 mil voluntários.
"O futuro dos Jogos depende disso", disse
Andrada, deixando claro que não será possível seguir com orçamentos abundantes
para megaeventos esportivos numa época de crise como a que o Brasil vive
atualmente.
MPF, TCU e sigilo
Ainda no início de setembro, a BBC Brasil ouviu o
Ministério Público Federal (MPF) e o Tribunal de Contas da União (TCU), que
manifestaram preocupação com a falta de transparência orçamentária da
organização dos Jogos e com a possibilidade de que o governo federal arque com
deficits – algo que já ocorreu, no setor de segurança dos Jogos.
Image copyright Reuters Image caption Prefeito Eduardo Paes (dir.)
percorre pista de BMX que será usada nos Jogos Olímpicos .
Em entrevista à BBC Brasil, o ministro Augusto
Nardes, destacado pelo TCU para fiscalizar as contas e o legado dos Jogos, e o
procurador da República Leandro Mitidieri, do Grupo de Trabalho de Olimpíadas
do MPF, cobraram maior transparência.
Como maior exemplo de despesa originalmente
prevista como do Comitê Rio 2016 e absorvida pelo governo federal, o ministro
destacou o esquema de segurança das Olimpíadas. Somente o Ministério da Justiça
já destinou R$ 350 milhões para investimentos na área.
"A segurança dos Jogos não era para ser paga
pela União. Isso não está sendo cumprido", disse Nardes, questionando a
ausência de um legado numa área crucial para o Rio.
"Vamos ter as Forças Armadas, de acordo com o
plano do governo federal, mas deveríamos ter uma política permanente de
segurança que ficasse como legado para o Estado", indicou Nardes.
Mantidas em sigilo, as estimativas de gastos do
Comitê Rio 2016 financiados por recursos privados são cruciais para as contas
públicas, já que o governo brasileiro se comprometeu com o COI de assumir
responsabilidades do comitê caso necessário.
Questionado pela BBC Brasil, no início de setembro,
o Comitê Rio 2016 declarou que, "ao contrário dos entes públicos, é
financiado por recursos privados e por isso não tem a obrigação de prestar
contas e publicar seu orçamento" e que "não trabalha com a hipótese
de extrapolar seu orçamento".
Já o presidente do Comitê Rio 2016, Carlos Arthur
Nuzman, ao ser indagado sobre o assunto pela BBC Brasil em Londres, ainda no
mês passado, disse que há cláusulas de confidencialidade com parceiros privados
que impedem a publicação de todos os contratos e que as contas serão feitas ao
término da Olimpíada.
"Alguns contratos têm confidencialidade de
patrocinadores, e as companhias têm que ser respeitadas. Vamos terminar os
Jogos e fazer a prestação de contas total da parte que diz respeito ao Comitê
Organizador. (Sobre) os demais, cada um fala por si", disse.
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